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As informações falsas – popularmente chamadas de fake news – ganharam maior relevância durante a pandemia da Covid-19, com mensagens questionando a eficácia de vacinas, propondo tratamentos sem eficácia para a doença e até mesmo sugerindo que o vírus seria fictício.
O conteúdo, que circula em redes sociais, e-mails e aplicativos de conversas, estão por trás de um amplo mercado que lucra diariamente com as mentiras difundidas com cara de notícia. É o que aponta um relatório do Centro de Combate ao Ódio Digital dos Estados Unidos (CCDH): 12 dos principais influenciadores antivacina do país representam uma indústria com receitas anuais de ao menos 36 milhões de dólares.
Isso porque esses perfis impactam milhões de seguidores que clicam em links com anúncios, compram cursos com premissas duvidosas e alimentam um mercado que rende até 1,1 bilhão para as redes sociais que abrigam os conteúdos, segundo o documento. Em 2020, por exemplo, um estudo da Universidade de Oxford, no Reino Unido, indicou que 61% dos sites que propagam fake news são financiados por plataformas de anúncios, como o Google Ads.
No Brasil, a realidade não é diferente. Durante a CPI da Covid, o Google forneceu uma lista de 385 vídeos retirados do Youtube depois de serem identificados como disseminadores de desinformação sobre a pandemia. Ao todo, o material rendeu aos perfis o equivalente a 230 mil reais antes de ser removido do ar.
Essa indústria oferece uma série de riscos para a saúde de pessoas que buscam na internet dados sobre doenças, tratamentos, sintomas ou apenas maior conhecimento em relação a temas ligados ao corpo humano. Levantamos algumas fake news que circulam hoje no País sobre saúde e que faturam com a desinformação, e ouvimos especialistas que explicam por que é importante não acreditar em tudo que se vê online.
“Detox Covid”
O médico José Nasser – já conhecido por divulgar tratamentos sem eficácia para a Covid-19 e criticar a vacinação – é um dos que lucram diretamente com a venda de informações falsas. Em curso chamado “Detox Covid”, ele promete explicar “por que não se faz vacinação em massa durante uma pandemia” e ensinar terapias para “purificar seu organismo das substâncias tóxicas presentes nas vacinas”. Divulgado por meio de newsletters e redes sociais, o material de 13 videoaulas é vendido por 497 reais, à vista, ou 608,76 reais, de forma parcelada.
Na divulgação, Nasser afirma já ter um total de 1.200 alunos. O montante garante que o médico recebeu ao menos 596.400 reais com a divulgação do material que relaciona as vacinas a ingredientes tóxicos – o que não tem lastro na realidade, explica a vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabella Ballalai.
“Essa informação de que não se deve fazer vacinação em massa é totalmente errada. Primeiro que a vacinação já se mostrou eficaz em controlar a Covid-19, que com bilhões de doses aplicadas possibilitou uma melhora, não piora do quadro epidemiológico. Além disso, todas as vacinas têm um excelente perfil de segurança e não contam com nenhum ingrediente tóxico. Essa ideia é comum em falas antivacina porque esse movimento está muito relacionado à oferta de tratamentos que não funcionam, vendendo terapias alternativas não eficazes, e usam esses ataques à vacina para isso”, diz a especialista.
Tratamentos naturais e milagrosos
Substâncias supostamente naturais e que teriam efeitos superiores aos de remédios também são vendidas online com discursos sem embasamento científico. Cursos com propagandas enviadas em newsletters que chegam por e-mail e veiculadas até mesmo em redes como Youtube prometem combater doenças como câncer e Alzheimer, sem medicamentos com eficácia comprovada.
Em material direcionado ao combate de tumores, por exemplo, pessoas pagam até 1.164 reais para ter acesso a um protocolo “100% natural” capaz de reverter a doença com uma “cura universal”, o que não existe, explicam especialistas. Na série de cursos oferecidos pela empresa Jolivi Natural Health, há ainda um de 1.524 reais que promete “reverter o Alzheimer”, doença que não tem cura ainda.
A microbiologista Natalia Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência, explica que existem substâncias naturais que são eficazes para tratar doenças, mas elas precisam ser testadas e comprovadas pela ciência, o que não é o caso. “Essas empresas se aproveitam de uma ideia de que tudo que é natural é bom, simplesmente por ser natural, e que tudo que é criado pelo homem, como os remédios, é ruim. O perigo é que você desvia os pacientes de tratamentos adequados para doenças graves e atrasa diagnósticos. Existem estudos que mostram que isso pode elevar a taxa de mortalidade, porque quando eles recorrem ao tratamento comprovado, pode ser tarde demais”, afirma Natalia.
Vacina tríplice viral causa autismo
Desde que o médico britânico Andrew Wakefield apresentou uma pesquisa preliminar, em 1998, que relacionava o desenvolvimento de comportamentos autistas em 12 crianças com a vacina tríplice viral – que protege contra sarampo, caxumba e rubéola – movimentos negacionistas têm reverberado a afirmação, embora ela tenha se mostrado falsa.
Em 2010, depois que estudos comprovaram que a ligação é inexistente e que a pesquisa havia sido fraudada, o Conselho Geral de Medicina do Reino Unido julgou que o médico é “inapto para o exercício da profissão”, e a plataforma onde o estudo havia sido publicado se retratou e afirmou que as conclusões eram “totalmente falsas”. Isabella Ballalai, da SBIm, explica essa tese negacionista tem ganhado força inclusive em relação a outras vacinas, como a da Covid-19, apesar de a ciência e os dados de vida real mostrarem que ela não é verdade.
“Hoje, essa ideia foi incorporada pelo movimento antivacina para todas as vacinas, mas todos os estudos mostram que não há relação de qualquer imunizante com o autismo, o que é comprovado pelos dados na prática. O autismo pode ser diagnosticado a qualquer momento da vida e, mesmo no caso da coincidência de a criança ter se vacinado e em um momento próximo ter sido diagnosticada, isso não quer dizer que há uma relação causal”, reforça a especialista.
Chá de erva doce cura a gripe
Uma mensagem que circula nos aplicativos de mensagem sugere que o chá de erva doce teria a mesma substância presente no Tamiflu, um remédio antiviral utilizado para combater a Influenza, patógeno causador da gripe. O infectologista da UFRJ e presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Alberto Chebabo, pontua que, embora o chá até possa ajudar a manter o corpo hidratado durante o combate ao vírus, é falsa a premissa de que ele teria propriedades antivirais.
“O Tamiflu é uma medicação criada especificamente para o vírus Influenza, que age na sua replicação no organismo, e essa substância não existe no chá. Então, a bebida até pode ajudar a hidratar o corpo enquanto o sistema imune combate o vírus, mas ela não age diretamente nele. Não seria eficaz, por exemplo, para tratar casos graves que precisam do remédio”, explica Chebabo.
Chá de emagrecimento rápido
As formas milagrosas para se perder peso também dominam a internet. De acordo com um levantamento da FGV / DAPP, de maio do ano passado até abril deste ano, foram cerca de 1,17 milhão de relatos e dicas para emagrecer e se manter em forma publicados no Facebook – mas nem todos funcionam.
De acordo com os pesquisadores, as postagens com maior engajamento na plataforma são aquelas com receitas que alegam proporcionar uma queima rápida da gordura. É o que propõe um vídeo, com mais de 8 milhões de visualizações, que ensina uma bebida caseira capaz de emagrecer e que traria resultados em apenas sete dias por conter vinagre de maçã.
“Só que esse potencial não existe do ponto de vista científico. O vinagre ajuda a acidificar o estômago e no processo de digestão, mas os benefícios só foram vistos para pessoas com problemas ligados à produção de suco gástrico. Mas não tem evidência que relacione à perda de peso, nem o vinagre de maçã nem qualquer outro alimento. Então não existem fórmulas mágicas e alimentos milagrosos para isso”, explica a nutricionista Priscilla Primi, mestre em saúde pública.
Ela chama atenção ainda para os perigos de outros chás que se dizem emagrecedores e são compartilhados na internet. Isso porque eles podem levar a um quadro de insuficiência hepática grave, uma vez que determinados compostos envolvidos em receitas podem sobrecarregar o fígado quando consumidos em altas quantidades.
Ozonioterapia como tratamento de doenças
Em diversas redes, é possível encontrar divulgações da ozonioterapia e de sessões com a técnica que prometem desde o alívio de dores crônicas até o tratamento do câncer. No entanto, o Conselho Federal de Medicina afirma, em resolução de 2018, que a ozonioterapia é um método “em caráter experimental, cuja aplicação clínica não está liberada”. Isso porque não há evidências científicas sobre os benefícios alegados pela prática, explica a microbiologista Natalia Pasternak.
“A ozonioterapia usa o ozônio, às vezes injetado diretamente no local ou até mesmo pela via retal. Mas esse é um gás tóxico e, além de não ter nenhum estudo científico que comprove que isso funcione para tratamento de qualquer tipo de doença, as pessoas podem ter problemas de saúde causados por ele. Por exemplo, para ter um efeito de combate aos germes, alegado por defensores da prática, a concentração do gás teria que ser muito mais alta que aquela suportada pelo organismo “, diz a especialista.
Fonte: Foto: Reprodução, Redação O Sul